O que faz uma Psicopedagoga? – com Sonia Maria Pereira

Entrevista 30 – 20/04/2016

20/04/2016 00h01 (GMT -3)

 

Psicopedagoga

 

Meu nome é Sonia. Eu sou docente universitária e também trabalho como Psicopedagoga clínica e psicomotricista. Eu trabalho na cidade de São Paulo, tanto na docência, como clínica.

[Escolha Profissional]
Eu comecei a minha carreira, a minha vida profissional, dando aula. E fui trabalhando com todas as faixas etárias e, uma das coisas que mais me preocupava, era ver a dificuldade de algumas crianças. Quando nós estamos falando de dificuldade, não estamos falando, especificamente, de distúrbio, mas de dificuldade. Até que ponto seria da própria criança, até que ponto seria da metodologia, até que ponto seria do próprio espaço sociocultural. Como é que você pode ajudar uma criança, um adolescente, um jovem, nessa área de dificuldade.

Mas, só Psicopedagogia não me foi suficiente. É quando eu, realmente, vou para a psicomotricidade também, que ela trabalha o motor, o social e o afetivo.

[Função]
O Psicopedagogo pode atuar em diversas áreas:

– Ele pode ser um psicopedagogo exclusivamente da escola. Então, você vai atuar com os professores da escola, com a metodologia que é utilizada naquela escola. E, quando uma criança tem uma dificuldade, você orienta o professor como trabalhar com aquela criança;
– Mas também tem o psicopedagogo do hospital. Dentro dos hospitais, quando a criança for ficar um tempo mais prolongado, ele tem direito a ter os seus estudos dentro do hospital. E o psicopedagogo atua nessas classes hospitalares;
– Ele pode ser também psicopedagogo empresarial. Quando você fala da dificuldade de aprendizagem, você fala também da dificuldade do trabalho em equipe, do trabalho em grupo e o psicopedagogo irá trabalhar o perfil desses profissionais;
– Já, a psicopedagogia clínica, é quando você trabalha o seu paciente num espaço único na clínica;
– Tem um outro nicho de mercado hoje, que é o que eu começo a atuar, que é a psicopedagogia da nutrição. Por exemplo, nós temos um caso de uma criança que não consegue comer, que ela não experimenta nada e ela já está numa idade onde ela já conhece todos os tipos de alimento. O psicopedagogo sabe exatamente o que ele vai trabalhar com o lúdico com aquela criança, o que aquela criança pensa a esse respeito. O nutricionista me dá exatamente o que essa criança precisa comer, a quantidade, e juntos a gente faz um trabalho, por isso que é psicopedagogia da nutrição.

[Atividades diárias]
O psicopedagogo na escola, normalmente, tem suas funções o dia todo, direto: ele começa com os professores, com todas as dificuldades e facilidades de seus professores, para depois ele chegar nas crianças, na realidade, enviado pelo próprio professor, e ele tem aí outro campo: tanto preparar formas diferenciadas para ser trabalhada com cada criança, como também o psicopedagogo também faz esse trabalho com a criança, especificamente, no horário inverso do horário de aula dessa criança.

Ele é diferente de um professor particular, ele não tem a mesma conotação. Na realidade, você vai a fundo aonde é, se existe realmente, por exemplo, na criança, algum bloqueio, se existe um problema socioafetivo, se existe também algum tipo de distúrbio que esteja  comprometendo cognitivamente essa criança.

No hospital o seu dia é canalizado de planejamentos porque nós temos que pensar que essa criança no hospital está num momento onde a escola está ali dentro e ela não está indo para a escola; ela não sabe o que vai almoçar; ela não sabe quais exames que ela vai passar naquele dia; ela não sabe quem vai visitá-la e esse professor é muito importante, essa escola. Esse professor, na realidade, consegue um elo da criança lá fora e dentro do hospital, só que ela é uma criança que está resiliente, ela é uma criança que precisa de muito naquele momento. Então, quando você está trabalhando no hospital, se você faltar é uma coisa muito séria, porque essa criança está ali envolvida esperando esse momento. Se o caso da criança não pode ir para a sala, na realidade, ela é atendida no próprio leito.

Você têm crianças que não estão na unidade escolar, onde você faz todo um desenvolvimento psicomotor na brinquedoteca; você têm as crianças que frequentam a escola e você entra em contato com a escola, pega exatamente a programação que está tendo e você adapta para a criança ali de acordo com as possibilidades dela naquele exato momento.

Dentro da empresa você trabalha junto com o Recursos Humanos (RH) onde, quando um setor está tendo problemas, podendo ser de relacionamento, de entendimento, de normas, é onde você cria planejamentos específicos para poder atuar.

[Formação]
Quando você faz a graduação você têm as especializações. O período é de dois anos.

A psicopedagogia, na realidade, você tem o pedagogo e você tem o psicólogo. E hoje ele começa a abrir também para outras áreas: pessoas que também fizeram terapia ocupacional.

[Profissional bem-sucedido]
Existe uma coisa que é muito importante. Existe uma questão de como você atende esse paciente, essa mãe, essa criança. Aqui está o sucesso.

As pessoas têm que ter um atendimento humanizado e esse atendimento humanizado é você olhar para essa mãe, é você olhar para essa criança, é você olhar para esse profissional, é você ouvir esse profissional, não é você chegar “eu SOU psicopedagoga”, “eu SOU psicomotricista”. Quem é essa pessoa que está na sua frente? O seu sucesso está na forma como você atende, é na forma que você entra na vida das pessoas e que você passa a buscar, a construir junto com ela solução para os seus problemas. Nada é sozinho. Você não vai resolver nada se você não conseguir  que essa mãe, essa família, confie em você. Você não vai conseguir nada se você não conseguir que a escola confie no seu trabalho. O seu sucesso depende de você conseguir fazer esse vínculo.

[Inspiração profissional]
Existe um lado que inspirou sempre: aquele que é menos favorecido. É muito ruim você chegar numa escola como eu cheguei, muito nova, e ver exclusão, ver aquela criança que não sabia, que ficava de castigo, que era rotulada de burro, que sofria bullying, que não tinha o nome de bullying, e você de repende descobrir que atrás daquela criança que tinha um caderno sujo, ela era alfabética. Mas o caderno sujo a rotulava que não sabia de nada. O bom aluno era aquele que tinha determinadas características imposta por um modelo tradicional e esse diferente estava sempre excluído.

O que me motivou sempre foi trabalhar com essa criança com dificuldade.

[Análise da trajetória profissional]
Quando eu iniciei, foi muito interessante. Eu comecei com uma criança com Síndrome de Down e daí eu estava numa clínica e, numa das sessões, fiz essa criança responder todas as cores para mim e, quando eu saí dessa sessão, eu gritei para os outros profissionais “eu já consegui! Em uma sessão e ela já conhece todas as cores.”. E os profissionais olharam para mim e não me falaram nada.

A gente não pode achar que aquilo que você quer é o que é mais importante e que vai ser duradouro. Na realidade, cada criança é cada criança; cada síndrome é uma síndrome. Você não pode se achar o sucesso quando você não é. Você tem que caminhar e é a cada dia. E, caminhar muito tranquila e sem gritar êxito. Não chegue achando que você está começando do auge e que os outros não sabem nada. Ouça sempre os outros profissionais, procure o outro, trabalhe em equipe, valorize o outro, valorize o conhecimento do outro. O seu sucesso vai depender da sua humildade.

[Perspectiva da profissão]
Nós passamos hoje por várias aprovações que estão aí para ter, por exemplo, um psicopedagogo em cada escola. O psicopedagogo em cidades do interior já tem, dependendo da cidade, já tem, pela prefeitura, um psicopedagogo em cada escola.

Cada vez mais essa figura do psicopedagogo se coloca, principalmente, no hospital e na clínica. No hospital, é por lei, tem que ter as classes hospitalares. Hoje, ainda pode ser o pedagogo para trabalhar dentro da classe hospitalar, mas nós sabemos do diferencial de quando é o psicopedagogo com foco em psicopedagogia hospitalar.

Para trabalhar em empresa, ele também tem um papel muito específico dentro de um momento de você trabalhar somente em equipe, dentro de você falar de motivação, dentro de você falar em competição de mercado, de problemas financeiros. Ele também tem um foco específico.

Muitos pais procuram o psicopedagogo por não querer, por algum motivo, o psicólogo. Isso não é correto. O psicólogo tem o seu papel, ele é super importante assim como o psicopedagogo. Então, na realidade, também os pais precisam ter clareza de quando é um psicopedagogo de quando é um psicólogo ou quando são os dois, quando eles se complementam. Então é uma profissão que ela tende a se expandir. Mas o que precisa hoje é de bons trabalhos e esses bons trabalhos terem a oportunidade de ser levado.

[Remuneração]
Depende exatamente da área que ele se encontra. A área clínica é a área que você tem uma melhor remuneração, porque na área clínica você tem um trabalho pelo paciente e, normalmente, as pessoas, os profissionais que trabalham na área clínica eles acoplam isso com docência, com cursos de pós-graduação, é o que tem uma melhor média salarial. Essa média salarial, nesse exato momento, está variando entre R$4 mil e R$6 mil.

Dentro da escola, essa média, normalmente, fica entre R$3 mil.

No hospital, ele ainda está ganhando como professor nesse exato momento. Então ele tem uma média salarial de professor. Só que ao invés de ele estar alocado na escola, ele está alocado no hospital. E, normalmente ali, vai variar. Têm muitas prefeituras, de Carapicuíba, por exemplo, que a própria prefeitura que está selecionando esse profissional para os hospitais. Daí ele já tem outro tipo de salário, diferente do salário que vem do próprio Estado. Então isso vai depender muito do local que ele se encontra, Na empresa ele tem um salário como o do psicólogo, ele trabalha no setor de RH, vai depender daqui da empresa que também existe um diferencial de salário.

[Pontos negativos]
Bem, os pontos negativos existem em alguns trabalhos que não foram desenvolvidos com uma boa ênfase. Então, as pessoas confundem muito psicopedagogo com o pedagogo, com o professor particular. Então, muitas vezes quando chegam para mim, chegam achando que eu vou ser o professor particular. A própria mãe chega trazendo todas as atividades que a criança tem que fazer em casa. É muito difícil você tirar essa questão cultural do que é realmente o psicopedagogo, qual é o papel dele, o que ele faz. Isso acaba prejudicando.

Uma outra questão é a nossa falta de sindicato. Nós temos somente uma associação, que é muito importante, que é a associação dos psicopedagogos, super importante. Mas nós não temos esse sindicato que também considero, como socióloga, muito importante, que nós deveríamos ter.

[Pontos positivos]
Um ponto positivo é que, cada vez mais, você se torna mais reconhecido. Então, cada vez mais você consegue provar e mostrar seu papel dentro de um contexto.

[Indicação de leitura – Confira em: goodreads.com/grupoitos ]
Hoje, a gente tem uma gama de livros muito grande, uma oferta, coisa que anteriormente a gente não tinha. Agora, existem livros básicos para a nossa profissão, porque eles são muito ricos. Por exemplo, Vitor da Fonseca com a psicomotricidade; o Piaget é uma base do pedagogo, não dá, porque o Piaget trabalha com a questão cognitiva, ele trabalha com a hipótese, que cada dia é mais atual.

Hoje, a gente tem pessoas que tem se saído muito bem perante os educadores, perante os profissionais, como o próprio Cortella. Ele tem uma linguagem que as pessoas gostam muito. Ele tem uma forma de chegar até você.

[Mensagem Final]
É muito importante, nesse momento, no qual a gente vive, onde o que é evidenciado, o que tem muita ênfase, é tudo o que dá errado, é tudo o que ocorreu de desgraça, são coisas horrendas, é a nossa realidade. Mas é muito importante também que se levante aquilo que está dando certo, as coisas boas, aquilo que está acontecendo de bom. As pessoas que estão se movimentando para desenvolver novas atitudes, novos projetos, novo tipo de trabalho e com uma ação humanizada. O que nós precisamos, cada vez mais, são de ações humanizadas de todos os profissionais. É quando você olha para o outro na sua integralidade. É quando você olha para o outro em todos os aspectos. E quando você começa a perceber que o discurso depende de onde se encontra esse sujeito. O indivíduo é um todo e não somente uma parte.